quarta-feira, 19 de agosto de 2009

EMPÉDOCLES de AGRIGENTO

Figura lendária, tomada como profeta ou imortal (como o próprio a si se referia), Empédocles (492-432) era filho de família aristocrática em Agrigento.


Pensador da antiguidade que inaugura o pluralismo. Num rompimento com a interdição eleata, tenta resolver o problema de Parmênides (tomar como realidade apenas o ser absoluto, uno e imutável e negar a possibilidade do movimento). Empédocles constrói uma visão global da vida e do somo. Deixou dois textos: “Sobre a Natureza” – tratado de cosmologia – e “Purificações”, cujo conteúdo versava sobre a natureza da alma e a salvação pessoal.

Sua formação comunga, inicialmente, com os postulados eleatas, mas Empédocles consegue superar a proibição de pensar o movimento, ao propor que alguma coisa pode, em lugar de se originar do nada, surgir de outra coisa já existente. E o que desaparece, na verdade, consiste no transformar-se em outra coisa (exceto o nada). O filósofo, ainda, revaloriza e reintegra na sua reflexão a contribuição dos sentidos.

Numa visão bastante atual, Empédocles consegue afirmar o postulado científico contemporâneo da matéria como energia condensada. Nas palavras de Santos (2001, 97): “Na realidade, por trás das aparências, o que ocorre verdadeiramente é a agregação de elementos, a qual dão o nome de nascimento e separação de elementos, a qual chamam de morte ou destruição. Esses elementos que se agregam ou se separam, dando origem à multiplicidade de coisas, a água, o ar, o fogo e a terra, têm os mesmos atributos do ser de Parmênides: são incriados, imutáveis, irredutíveis e imperecíveis”. Em lugar de um único ser original, vários. A origem é plural. Os elementos originários, todos iguais em importância, são as “raízes de todas as coisas”. Essas raízes são, na verdade, os quatro elementos (terra, água, fogo e ar) que, por agregação, formam os seres e pela desagregação levam-nos à morte. Nessa desagregação, os elementos voltam a ser aquilo que sempre foram, voltam ao seu estado puro.

Os processos de agregação e desagregação pressupõem o movimento. O que leva os quatro elementos a se agregarem ou se desagregarem são duas forças cósmicas: atração e repulsão (link com Kepler e a moderna cosmologia): o amor e o ódio são realidades naturais. “O mundo perece segundo a predominância alternada do Ódio e do Amor” (Aécio, II, 4, 8, GB p83).Por essa razão, há predominância e não há surgimento ou destruição absolutos.

Na tentativa de explicar o universo, Empédocles afirma que o momento inicial não foi marcado nem pela primazia do Amor (caso em que os elementos estariam de tal modo unidos nem esfera única, indiferenciada e homogênea que não se poderia distinguir elemento algum), nem pelo predomínio do Ódio (situação inversa, na qual, os elementos estariam tão separados, tão individualizados que não seria possível a formação de nada). Para o filosofo, o momento da criação dá-se, na verdade, na passagem de uma fase à outra, momento em que tais forças estariam agindo de forma conjugada.

Nesse processo há um movimento de contração e distensão semelhante ao da respiração. Na esfera inicial, os elementos estavam juntos, unidos pela força do Amor, mas a discórdia se aproxima, deslocando-se da superfície da esfera para o centro, provocando a separação. Em um estágio seguinte, o ciclo se repete inversamente e tem-se, de novo, a união dos elementos.

Além de se voltar para as questões da criação, Empédocles preocupou-se com a natural dificuldade humana de compreender a realidade. Em suas reflexões, desenvolveu uma teoria da percepção na qual defende que das coisas emanam eflúvios que são percebidos pelos sentidos humanos. A percepção se dá porque o semelhante atrai o semelhante, isto é, partes semelhantes emanadas pelas coisas são atraídas por partes semelhantes dos órgãos dos sentidos. São palavras suas: “E o conhecimento do igual se faz pelo igual” (Aristóteles, Metafísica, III, 4, 1000b). Segundo Santos (2001, 102), “Essa teoria psicofísica da percepção, ainda que em forma de crisálida, é precursora da teoria da representação subjetiva e nos permite concluir que Empédocles, de alguma maneira, confia nos sentidos para a aquisição do conhecimento”. Ainda para Empédocles, não só homem, mas todos os seres, animais e vegetais, são dotados de pensamento. E a maior concentração de pensamento é encontrada no sangue: “Por isso pensamos com o sangue. Pois neste estão os elementos melhor misturados”. Suas especulações sobre a alma aproximam-se muito dos ensinamentos órficos-pitagóricos. A alma expia, em encarnações sucessivas, uma falta anterior. Libertada da roda de nascimentos, ela volta ao Olimpo, para a bem-aventurança: “Há um oráculo da Necessidade, decreto dos Deuses, antigo, eterno, selado com largos juramentos: se alguém manchou criminosamente suas mãos com sangue, ou, em conseqüência do Ódio, cometeu perjúrio, e – um destes demônios agraciados com longa vida, – deve errar três vezes dez mil anos, longe dos bem-aventurados, e nascer no curso do tempo sob todas as formas mortais, trocando um pesado caminho d vida por outro. Pois o ar poderoso empurra-os ao mar, o mar os cospe sobre a terra, a terra os projeta aos raios do incansável sol, e este os lança nos turbilhões do ar. Um os recebe de outro, mas todos os odeiam. A estes também, agora, pertenço eu, um banidos dos deuses, errante, por ter confiado no furioso Ódio.” (Empédocles, Frag, 115; GB p.79)

Hegel (1973) resenha as críticas feitas a Empédocles por Aristóteles. Em sua Metafísica, Aristóteles argumenta que falta a Empédocles a proposição de um principio ainda mais profundo que o Amor e o Ódio, o fim. Ele se caracteriza por ser um conceito, fixo em si e para si, autodeterminante, verdadeiro e absoluto, através do qual tudo é. Dessa forma, Aristóteles coloca-se também contra Heráclito sua defesa da eterna mudança. Hegel (1973) mostra ainda que Aristóteles argumenta contra a premissa da união e separação em Empédocles, posto que “O separado, o que se imobilizou num lado, é ele mesmo algo unido em si – é a sua autonomia. A separação dos elementos, que estão unidos no universo, é união entre si das partes de cada elemento” (HEGEL, 1973, p. 195). Pro fim, afiram que a proposta de Empédocles sobre a origem das coisas não é consistente.

Nietzsche também faz algumas considerações sobre as propostas de Empédocles. Ao mesmo tempo em que aponta certas inconsistências, mostra como algumas das afirmações de Empédocles ecoaram pela ciência ocidental através dos séculos, com contribuições para a Física e, até, para a teoria de Darwin. Reconhece Nietzsche que no caso de Empédocles, o pensamento mítico e o pensamento científico andam lado a lado, que o filósofo foi um homem agonal, no qual dois séculos se defrontavam, era, ao mesmo tempo, o homem do mito e o grego moderno, racionalista, criador de analogias e democrata.

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