sábado, 22 de agosto de 2009

ZENÃO de ELÉIA

Filósofo e político, cuja maturidade se deu entre 464 e 461 a. C, Zenão foi discípulo de Parmênides e desenvolveu atividade filosófica baseada na defesa dos preceitos eleatas, principalmente contra os pitagóricos. Aristóteles tratava-o como o fundador da dialética em razão de ter desenvolvido a técnica argumentativa da ‘reductio ad absurdum’, técnica que consiste em destruir a proposta do adversário quando se mostra que ela, uma vez admitida, pode levar ao absurdo, ao contraditório e ao irracional.
Zenão desenvolveu um conjunto de argumentos contra a possibilidade da multiplicidade e do movimento. “Nos argumentos desenvolvidos contra a possibilidade do movimento, Zenão levou em conta os entendimentos contrários do tempo e do espaço, defendidos na antiguidade, entre os pensadores gregos. O primeiro, o de que o movimento é contínuo, porque o espaço e o tempo são infinitamente divisíveis; o segundo, o de que o movimento é descontínuo, constituído por uma sucessão de passos, porque o tempo e o espaço são composto de unidades indivisíveis. Se o espaço é infinitamente divisível, o que se move levará um tempo infinito pra percorrer o numero infinito de partes intermediárias conseqüentes dessa divisão. Se o espaço, ao contrário, não é infinitamente divisível, cessa a divisão na unidade indivisível.”(SANTOS, 2001, 74).
Em termos concretos, o primeiro argumento pode ser exemplificado pela situação de um atleta que, partindo da extremidade de um campo para alcançar a outra, teria que atingir a metade do percurso, e em seguida a metade da metade e, assim, sucessivamente ao infinito e acabaria não alcançando a outra extremidade. Isso assim se dá porque o espaço está sendo pensado em termos de um número infinito de pontos. O outro argumento é famoso em função da conhecida história de “Aquiles e a tartaruga”. De acordo com a argumentação de Zenão, construída como forma de reduzir o argumetno contrário ao absurdo, Aquiles jamais alcançará a tartaruga porque esta está um ponto à sua frente e ele precisa alcançar esse ponto e, neste momento, ela já terá se deslocado.
O terceiro exemplo argumenta em favor da ilusão do movimento. Denominado o exemplo da ‘Flecha disparada’, o argumento sustenta que a cada instante do tempo a flecha está em repouso porque ocupa um espaço idêntico ao de si mesma. Então o movimento é aparente porque há uma sucessão de espaços ocupados pela flecha. O quarto argumento, considerado o mais complexo, necessita que se tome o tempo e o espaço como compostos de unidades indivisíveis. A situação envolve um corpo AAAA em repouso e dois corpos, BBBB e CCCC, com mesma velocidade, mas com sentidos opostos. Ultrapassar dois AAAA significa ultrapassar os quatro CCCC, ou seja, a totalidade de CCCC corresponde à metade de AAAA. Ao se transformar unidades espaciais em unidades temporais, tem-se que a metade do tempo é igual ao seu dobro.
Conforme nos lembra Santos (2001), os argumentos de Zenão são puramente conceituais, teóricos, são de natureza formal, porque trabalha com a idéia de que o mundo fenomenológico é ilusório e, portanto, inapropriado pra discussões sobre a essência do ser.
Segundo Russel (2002), os argumentos de Zenão são um ataque claro à idéia pitagórica da unidade e posicionam-se, também, contra a possibilidade do vazio e do movimento. Sua discussão acerca da magnitude da unidade tornou-o o grande pai do calculo infinitesimal. “Aquilo que, seja lá o que for, argumentaria Zenão, deve ter alguma magnitude. Se não tivesse magnitude alguma, não existiria. Admitindo-se que isto seja verdade, o mesmo pode ser dito de cada parte, que também deve ter alguma magnitude... Assim, se as coisas são muitas, precisarão ser pequenas e grandes ao mesmo tempo.” (RUSSEL, 2002, 54), Seu argumento acaba demonstrando que é impossível conciliar a teoria pitagórica das unidades com a idéia da divisibilidade infinita.
Em relação à questão do vazio, Zenão discute que se o espaço existe, ele deve estar contido em algo, que, por sua vez, está contido em mais espaço, indefinidamente. Assim, Zenão conclui pela não-existÊncia de que o espaço é um recipiente vazio. Para ele, não se pode distinguir entre um corpo e o espaço no qual ele está. De acordo com Abbagnano (1976, 51), “a intenção destes sutis argumentos... é bastante clara. O espaço e o tempo são a condição da pluralidade e da mudança das coisas: pelo que, se eles se revelam contraditórios, revelam que a multiplicidade e a mudança são contraditórios e por isso irreais.” Ficam, desse modo, fora das postulações sobre o ser desenvolvidas pelos eleatas.
Na crítica moderna que faz aos pré-socráticos, Hegel (1973) faz algumas considerações interessantes a respeito do pensamento de Zenão. Primeiro mostra que Zenão defendia uma idéia esférica de Deus porque ele é em toda parte igual. Além, disso, não pode ser tratado em termos de finitude ou infinitude, repouso ou movimento. Zenão afirma: “O um, portanto, não está nem em repouso sem se movimenta; pois não se parece nem com o não-ente nem com o múltiplo. Em tudo isto, Deus se comporta assim; pois ele é eterno e um, idêntico a si mesmo e esférico, nem ilimitado nem limitado, nem em repouso nem em movimento.” Partem desta abstração todas as postulações metafísicas acerca da identidade e da unidade de Deus comuns aos principais preceitos religiosos monoteístas com os quais convivemos.
Hegel (1973) também percebe em Zenão um apuro racional que o leva a questionar os sistemas tradicionais de refutação filosófica. Zenão mostra que um sistema filosófico quando quer refutar outro, coloca-se aquele como fundamento e a partir dele debate-se o oponente. A crítica, então, não é feita partindo-se do sistema filosófico que se quer refutar, tomando-o em si mesmo, mas a partir daquele que se quer comprovar como certo. “O outro sistema não possui verdade porque não concorda com o meu.” Infelizmente, quando olhamos os debates acadêmicos sob este ângulo percebemos a atualidade do ponto de vista de Zenão. O outro é/está errado porque é diferente. As guerras, os muros, os ataques terroristas comprovam-no.

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